sexta-feira, 29 de junho de 2012

Rebeldia


Rebeldia





O pequeno rebelde amava a Mãezinha viúva com entranhado amor; entretanto, iludido pela indisciplina, dava ouvidos aos conselhos perversos. Estimava a leitura de episódios sensacionais, em que homens revoltados formam quadrilhas de malfeitores, nas cidades grandes, e, a qualquer página edificante, preferia o folhetim com aventuras desagradáveis ou criminosas. Engolfou-se em tantas histórias de gente má que, embora a palavra materna o convidasse ao trabalho digno, trazia sempre respostas negativas e rudes na ponta da língua. – Filho – exclamava a senhora paciente -, o homem de bem acomoda-se no serviço. – Eu não! – replicava, zombeteiro. – Vamos à oficina. O chefe prometeu ceder-te um lugar. – Não vou! não vou!… – Mas já deixaste a escola, meu filho. É tempo de crescer e progredir nos deveres bem cumpridos. – Não fui a escola, a fim de escravizar-me. Tenho inteligência. Ganharei com menor esforço. E enquanto a genitora costurava, até tarde, de modo a manter a casa modesta, o filho, já rapaz, vivia habitualmente na rua movimentada. Tomava alcoólicos em excesso e entregava-se a companhias perigosas que, pouco a pouco, lhe degradaram o caráter. Chegava a casa, embriagado, altas horas da noite, muita vez conduzido por guardas policiais. Vinha a devotada Mãe com a socorro de todos os instantes e rogava-lhe, no outro dia: – Filho, trabalhemos dignamente. Todo o tempo é adequado à retificação dos nossos erros. Atrevido e ingrato, resmungava: – A senhora não me entende. Cale-se. Só me fala em dever, dever, dever… A pobre costureira pedia-lhe calma, juízo e chorava, depois, em preces. Avançando no vício, a rapaz começou a roubar às escondidas. Assaltava instituições comerciais, onde sabia fácil o acesso ao dinheiro; e quando a Mãezinha, adivinhando-lhe as faltas, tentou aconselhá-lo, gritou: – Mãe, não preciso de suas observações! Deixá-la-ei em paz e voltarei, mais tarde, com grande fortuna. Dar-lhe-ei casa, roupa e bem-estar com fartura. A senhora tem o pensamento preso a obrigações porque, desde cedo, vem atravessando vida miserável. Assim dizendo, fugiu para a via pública e não regressou ao lar. Ninguém mais soube dele. Ausentara-se, definitivamente, em direção a importante metrópole, alimentando o propósito de furtar recursos alheios, de maneira a voltar muito rico ao convívio maternal. Passou o tempo. Um, dois, três, quatro, cinco anos… A Mãezinha, contudo, não perdeu a esperança de reencontrá-lo. Certo dia, a imprensa estampou nos jornais o retrato de um ladrão que se tornava famoso pela audácia e inteligência. A costureira reconheceu nele o filho e tocou para a cidade que a abrigava. A polícia não lhe conhecia a endereço e, porque fosse difícil localizá-lo rapidamente, a senhora tomou quarto num hotel, a fim de esperar. Na terceira noite em que aí se encontrava, notou que um homem embuçado lhe penetrava a aposento às escuras. Aproximou-se apressado para surripiar-lhe a bolsa. Ela tossiu e ia gritar por socorro, quando o ladrão, temendo as conseqüências, lhe agarrou a garganta e estrangulou-a. Nos estertores da morte, a costureira reconheceu a presença do filho e murmurou, debilmente: – Meu… meu… filho… Alucinado, o rapaz fez luz, identificou a Mãezinha já morta e caiu de joelhos de dor selvagem. A desobediência conduzira-o, progressivamente, ao crime e à loucura.

 XAVIER, Francisco Cândido. Alvorada Cristã. Pelo Espírito Neio Lúcio. FEB.

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